O ministro paraibano Vital do Rêgo Filho, do Tribunal de Contas da União (TCU), foi o único a votar contra a privatização da Eletrobras. A venda foi autorizada pela Corte de Contas pelo placar de 7 votos a 1, nesta quarta-feira (19). Rêgo foi o ministro revisor no processo e se opôs à desestatização em duas oportunidades. Entre os argumentos utilizados, ele alegou que o negócio proposto pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) seria chamado na Paraíba de “de pai para filho”, com a venda do patrimônio público pela metade do preço.
Já no primeiro julgamento, ocorrido em fevereiro, Vital do Rêgo havia apontado falhas na avaliação do valor que o governo receberá para deixar o controle da Eletrobras. O governo estima receber R$ 67 bilhões por isso. Para do Rêgo, deveria receber ao menos R$ 140 bilhões. Nesta quarta, ele rechaçou a tese de prejuízo dado pela estatal, alegando que ela rendeu lucros acumulados de R$ 37 bilhões nos últimos quatro anos. O processo de venda da empresa ganhou os holofotes pelo número de jabutis, ou seja, obrigações que não têm a ver com a proposta original e que devem encarecer as tarifas de energia elétrica.
Em um voto longo –o qual foi elogiado por ministros do TCU por sua profundidade– do Rêgo afirmou que “erros dolosos” cometidos pelos responsáveis pela privatização farão com que ações da estatal sejam vendidas “a preço de banana”.
Vejas as seis ilegalidades citadas pelo ministro:
. dividendos devidos pela Eletronuclear à Eletrobras que, enquanto não forem pagos, não permitirão quem a ENBPar assuma o controle da Eletronuclear. A ENBPar é a estatal criada para gerir a Eletronuclear a Itaipu Binacional, que não serão privatizadas junto com a Eletrobras. Além disso, segundo Rêgo, parte desses dividendos será pago a acionistas privados após a perda do controle da Eletrobras, com prejuízo de R$ 743 milhões à União;
. subavaliação da Itaipu Binacional, com impacto direto no preço mínimo por ação da Eletrobras a ser ofertada ao mercado;
ilegalidades nos serviços de avaliação independentes contratados, com erros na estimativa de preço de venda de longo prazo de energia elétrica, o que afeta o preço da Eletrobras;
. percentual de cláusula de “poison pill” conflitante com a participação acionária igual ou inferior a 45% que a União terá ao final do processo de capitalização da Eletrobras. O mecanismo de “poison pill” visa desencorajar ou até mesmo impedir aquisições hostis de companhias listadas em bolsa de valores. A Eletrobras terá, após a privatização, seu capital pulverizado, sem um acionista controlador;
. ausência de consulta aos órgãos responsáveis pela Política Nacional Nuclear, em especial a recém-criada Autoridade Nacional de Segurança Nacional; e
. diferença de R$ 30,64 bilhões no cálculo do endividamento líquido da Eletrobras.
Risco a programa nuclear
Segundo do Rêgo, por pressa ou omissão, a proposta do governo ignora o fato de a Eletronuclear ter dividendos com pagamentos pendentes à Eletrobras. Essas dívidas podem fazer com que acionistas da Eletrobras passem a ter controle sobre a Eletronuclear, estatal que administra as usinas nucleares do país. Caso a Eletrobras seja mesmo vendida, na prática, seus compradores passariam a ter controle também sobre a Eletronuclear. Isso, segundo do Rêgo, contraria à Constituição e põe em risco a soberania do país.
“A política nuclear brasileira pode ser privatizada”, alertou. “Não venham dizer que isso será acertado depois. Isso não é ‘conta de padaria’”.
Itaipu mal avaliada
O ministro afirmou também que a proposta do governo não fez uma avaliação correta do valor de Itaipu, a qual pertence à Eletrobras, mas será vendida ao governo para que seja mantida sob controle do Estado mesmo se a estatal for privatizada.
Segundo do Rêgo, a Itaipu foi avaliada em R$ 1,2 bilhão. Valeria pelo menos R$ 10 bilhões. Se esse valor não for corrigido, as contas da Eletrobras serão prejudicadas. Seu valor de mercado, por consequência, será comprometido, contrariando o interesse público.
“É ultrajante”, disse. “Itaipu não está sendo subavaliada. Está sendo dada.”
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