O médico paraibano Marcelo Queiroga conquistou conceito local e nacional pela perícia na profissão e habilidade na política. Enquanto ministro da Saúde, ele tem usado muito desta experiência acumulada para dar respostas frente à maior crise sanitária da história do Brasil. Durante entrevista coletiva, nesta sexta-feira (16), em João Pessoa, ele rebateu a tese de que o país está atrasado na aplicação de vacinas. Disse que estamos em quinto lugar na distribuição dos imunizantes no mundo.
Daí você pode perguntar. Mas se estamos em quinto lugar no mundo, então não estamos atrasados? Afirmação do ministro, em números totais, está rigorosamente correta. Com 32 milhões de doses enviadas aos estados e municípios, o Brasil fica atrás apenas de Estados Unidos, China, Índia e Reino Unido. É uma marca condizente com a marca de sexto país mais populoso do mundo. Mas quando vamos para o atendimento proporcional da população, a máxima do ministro vira uma meia verdade.
O Brasil amarga a vexatória marca de 73º lugar entre 166 nações do mundo. Não custa lembrar que o país em que vivemos é um continente e tem 212 milhões de habitantes. Perto disso, o percentual de brasileiros que receberam pelo menos uma dose cai para pouco mais de 15% da população. É, de toda forma, uma marca hercúlea para uma nação que tanto negligenciou a necessidade de compra antecipada das vacinas.
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) abusou de dizer que o interesse de vender os imunizantes era dos laboratórios. De maneira simplista e míope, ele achava que haveria oferta gigante de vacinas. Não houve. Hoje o Brasil é o epicentro da pandemia e caminha para as 400 mil mortes. E caberá a Queiroga, com toda a sua habilidade, remar contra essa maré. Vai precisar para isso conseguir vacinas, o que ele admite não ser uma tarefa fácil.
Na entrevista concedida em João Pessoa, nesta sexta-feira, o ministro admitiu que há dificuldade na vinda dos insumos da China para cá. “Assim que a vacina é produzida nas duas indústrias, Butantam e Fiocruz, ela é repassada para os estados e para os municípios”, ressalta. O país, apesar de ter se tornado historicamente referência no mundo nas suas campanhas de vacinação, depende ainda do envio do IFA (Ingrediente Farmacêutico Ativo) pelos chineses.
Isso é decorrência do tipo de política de enfrentamento da Covid-19 implantada no Ministério da Saúde. O órgão teve quatro trocas de ministros durante a pandemia e foi paralisado por uma aparente overdose de cloroquina. A condução do país na pandemia fez com que vários especialistas passassem a acusar o presidente de adotar como política a imunização de rebanho. Em meio a tudo isso, as novas cepas do Coronavírus vêm assolando o país com cada vez mais mortes.
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Virando a chave, o Brasil tem capacidade de aplicação de 2,4 milhões de vacinas por dia, porém, sem o produto, raramente consegue ultrapassar a casa das 500 mil. É muito pouco para a demanda. Mais recentemente, um atraso no envio dos insumos chineses fez com que a produção nacional parasse. Resultado, faltou vacina e as cidades com melhor desempenho vacinal viveram um caos. João Pessoa entra nesta relação.
O secretário estadual de Saúde, Geraldo Medeiros, se disse otimista em entrevista ao blog, nesta sexta-feira, com a perspectiva de chegada semanal de 180 mil doses ao Estado. Essa, no entanto, foi uma garantia que o ministro responsavelmente evitou dar. Quando ele admitiu a dependência dos chineses, deixou claro apenas que enviará para os estados todas as doses que venham a ser entregues pelos laboratórios da Fiocruz e do Butantam.
A situação é crítica. Na América, o Brasil figura em 12º lugar. O país mais bem posicionado do continente é o Chile, que aplicou pelo menos uma dose em 37% da população. E mesmo com o avanço expressivo da vacinação por lá, o país sul-americano também tem enfrentado um colapso no sistema de saúde, o que indica que a contenção da pandemia precisa ser associada a medidas eficazes de distanciamento social e uso universal de máscaras capazes de evitar a infecção.
O fato é que sem vacina não será possível tirar o Brasil das cordas. A tarefa de Marcelo Queiroga, por isso, se reveste de maior importância.