Executivo
Queiroga joga legado no lixo ao insistir na proibição da vacinação dos adolescentes de 12 a 17 anos
19/09/2021 10:24
Suetoni Souto Maior
Marcelo Queiroga foi nomeado para o Ministério da Saúde para substituir o malsucedido general Eduardo Pazuello. Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O ministro Marcelo Queiroga (Saúde) vinha sendo festejado até bem pouco tempo pelos resultados à frente da pasta. Em pouco mais de seis meses, tirou o Brasil da incômoda posição de epicentro da pandemia do novo Coronavírus. A oferta da vacina e os “ouvidos moucos” ao negacionismo reinante no governo em relação à Covid-19 foram essenciais para isso. No entanto, tudo foi por terra na vida do ministro paraibano depois que ele decidiu proibir a vacinação dos adolescentes de 12 a 17 anos. Até mesmo aliados ferrenhos como o secretário de Saúde de João Pessoa, Fábio Rocha, elevaram o tom das críticas ao ministro.

E tem motivo para isso: as justificativas usadas por Queiroga para suspender a imunização têm a consistência de um prato de papa ralo. As informações de que a Organização Mundial da Saúde (OMS) não recomenda são falaciosas. A justificativa de que foram registrados casos de ‘efeitos adversos graves’ em jovens vacinados também caiu por terra. A própria Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) negou as evidências de que a morte de uma adolescente teria sido causada pela vacina. Não há dados que sustentem essa afirmação.

O secretário Fábio Rocha deu o “tiro de misericórdia” ao analisar a justificativa do ministro Marcelo Queiroga de que haveria riscos para a saúde dos adolescentes em caso de vacinação. A análise é bem simples: a vacinação está liberada para pessoas com comorbidade, inclusive os adolescentes. Então, se é indicada para pessoas com a saúde debilitada, a exemplo dos imunossuprimidos, como não seria para os adolescentes saudáveis? O secretário diz que até as mentes mais simplórias poderiam chegar à mesma conclusão ao refletir sobre o assunto.

A decisão é mais grave por causa das manifestações decorrentes da variante Delta, que tem atingido mais os adolescentes. Uma pesquisa do Centro de Controle de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, indica que mais de 30 mil crianças e adolescentes precisaram ser internados por Covid-19 durante todo o mês de agosto. É o pior mês desde o começo da pandemia. Ainda de acordo com os dados do CDC, as internações pela doença só aumentaram na faixa etária de 0 a 18 anos. Em todas as outras, reduziu. O governo dos Estados Unidos atribuiu o fenômeno à variante Delta.

A CBN conversou com duas pessoas que participaram da reunião da Câmara Técnica do Programa Nacional de Imunizações (PNI), que conta com médicos, professores, membros de conselhos de medicina e dos conselhos de secretários de Saúde. Eles ameaçam demissão coletiva se Marcelo Queiroga mantiver a decisão. Os profissionais entenderam que o ministro tomou uma decisão sem ouvir a ciência e as evidências que circundam a discussão. Na live semanal do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o ministro admitiu ter sido abordado sobre o assunto pelo presidente. E isso diz muito.

Essa constatação aponta para um caminho muito perigoso de nova interferência do gabinete paralelo que orientou o presidente durante a pandemia. As consequências disso foram vistas no número de vítimas. Depois de nos aproximarmos das 600 mil mortes por Covid-19 e de termos figurado por muito tempo na condição de epicentro da pandemia, parecia que essa etapa estava sendo vencida. Rescaldados por crises anteriores, os gestores de 24 capitais e outras cidades importantes decidiram peitar o governo federal e mantiveram a imunização dos adolescentes sem comorbidade.

O prefeito de João Pessoa, Cícero Lucena (PP), ensaiou embarcar na “rebelião” e iniciar a imunização, mas a decisão ainda não foi concretizada. Ao analisar o caso, ele questionou qual a diferença entre os adolescentes brasileiros e os do restante do mundo, onde a vacinação foi iniciada ou já está concluída. Essa tem sido a reação de gestores do Brasil inteiro também, que assistem atônitos às lambanças de Marcelo Queiroga a essa altura do campeonato. Ruim para o país, ruim para a Paraíba e ruim para Queiroga, que era visto até agora como um ministro fiel ao bolsonarismo, mas que ouvia a ciência.

Isso tudo fez surgir a tese de que o governo federal inventou a proibição por causa da falta de vacinas no mercado. Não haveria imunizantes suficientes para dar a dose de reforço aos idosos e ainda as duas doses da Pfizer para os adolescentes. Se essa for a causa, cairia bem ser transparente. E isso é tudo o que Queiroga não tem sido neste momento.

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