Executivo
Prefeito de Ouro Velho precisou de ‘puxão de orelha’ do TCE para desistir de festa com gasto astronômico
04/06/2022 10:29
Suetoni Souto Maior

O Tribunal de Contas do Estado (TCE) escancarou o absurdo: afinal, usando de qual lógica o prefeito de Ouro Velho, Augusto Valadares, gastaria com shows, neste ano, o dobro do gasto com obras no ano passado? A observação foi feita pelo presidente da Corte, Fernando Catão, e complementada pelo conselheiro André Carlo Torres. Este último mostrou que o município foi contemplado com grandes repasses federais na pandemia, mas que isso não se reverteu em benefício da população. O ato contínuo foi o cancelamento do contrato das principais atrações artísticas, pelo TCE, e a desistência da festa, pelo prefeito.

A Medida Cautelar que proibiu as contratações de Xand Avião e Priscila Senna, por R$ 420 mil, foi editada nesta sexta-feira (3), por André Carlo Torres. A festa junina ocorreria nos dias 7 e 8 de junho, mas só depois de ver o cenário completamente adverso o gestor decidiu cancelar a festividade que até seria justa, caso as atrações fossem condizentes com a capacidade de pagamento em uma cidade com pouco mais de 2,5 mil habitantes. E foi justamente isso o que foi dito durante a sessão no Tribunal de Contas da última quarta-feira (1º).

Diante de uma corte perplexa, Fernando Catão observou que o prefeito tinha investido durante todo o ano de 2021 apenas R$ 500 mil em obras na cidade e agora faria uma festa com orçamento estimado de R$ 1 milhão. Com base relatório técnico da auditoria do TCE, o conselheiro André Carlo Torres entendeu que o orçamento municipal não comporta créditos suficientes para a despesa. Mesmo diante do absurdo, o prefeito ainda lamentou o cancelamento ao se manifestar nas redes sociais. Ele falou em profunda tristeza e indignação com o fato.

O município do Cariri ocupa, atualmente, o 44º lugar no ranking paraibano no Índice de Desenvolvimento Humano, com 0,614, o que mostra muito por fazer no campo administrativo. A cidade carece muito mais de investimentos em saúde, educação e geração de empregos e menos de festas milionárias. A situação de lá não é diferente da de vários outros municípios, onde os prefeitos vão usar o dinheiro público para maquiar a baixa capacidade de gestão. O Tribunal de Contas, por isso, vai expedir recomendação para os gestores, alertando sobre a necessidade de comedimento e razoabilidade.

Estes absurdos sempre ocorreram na Paraíba e pelo país afora, mas ganharam destaque no noticiário recentemente por causa da hipocrisia de parte dos próprios artistas. Durante uma apresentação em um município do interior de São Paulo no mês passado, o cantor sertanejo Zé Neto, da dupla com Cristiano, decidiu desdenhar da cantora Anitta. Disse que não precisava do dinheiro da Lei Rouanet porque quem pagava a ele era o público. A mensagem era um afago nos eleitores do presidente Jair Bolsonaro (PL), críticos da legislação que financiou apresentações artísticas principalmente nos governos petistas.

Porém, não precisou de apuração muito grande para ver que o show no qual ele se apresentou foi pago com dinheiro público. Mas não apenas isso, que as contratações de artistas, principalmente os sertanejos, representam uma sangria milionária em municípios minúsculos. Em muitos casos, o dinheiro destinado para o pagamento dos cantores deveriam ser aplicados em saúde e educação. O escárnio com o dinheiro público, vindo dos rincões, é muito mais volumoso e menos republicano que o custeio via Lei Rouanet, bancado pela iniciativa privada com compensação através de impostos.

O escândalo serviu para que todos víssemos o que ocorre quando se destampa a latrina da hipocrisia.

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