Todos assistimos à invasão e quebra-quebra nas sedes dos Três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) no dia 8 de janeiro. Era, indubitavelmente, uma tentativa de golpe para solapar um governante legitimamente eleito. Parlamentares de oposição vibraram, apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) também. Os governistas assistiram a tudo incrédulos. Era evidente a existência de um plano e até ali não se sabia se as Forças Armadas entrariam na onda. Não entrou, apesar das evidências sobre a participação de muitos deles, principalmente inativos. A “rebelião” foi contida e, a partir daí, partiu-se em busca dos culpados.
Este roteiro, exposto de forma resumida, todo mundo conhece. Foram mais de 1,5 mil presos por determinação do Supremo. O recheio, porém, vem sendo construído através de narrativas pouco críveis que apontam armação para incriminar os patriotas. Evidências aqui e ali são apontadas. A última com uma suposta conivência do general Gonçalves Dias com os golpistas. Ele era o chefe do aparelhado GSI (Gabinete de Segurança Institucional). Vídeos até esta semana mantidos em sigilo mostram o militar conduzindo pacificamente vândalos do terceiro para o segundo andar.
O argumento dele é o de que conduziu os manifestantes para uma armadilha, já que eles seriam presos no segundo andar. Essa é uma narrativa que pode ou não ser verdadeira. As imagens não são capazes de mostrar intenção, mas dão margem para que se acredite em conivência. E o general sendo próximo ao presidente Lula (PT) complica não apenas a vida dele. Dá margem à narrativa do lado que até agora estava nas cordas, o dos aliados de Bolsonaro, este último apontado como suspeito de participação nos atos e ainda respondendo por suposta tentativa de apropriação de joias que deveriam ter sido entregues ao patrimônio nacional.
A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar os atos antidemocráticos, antes defendida apenas pela oposição, passou a ser defendida também pelos governistas. Motivo: apesar de as CPIs serem repelidas comumente pelos governos, esta não tem mais como ser contida. Se alguém perguntar quem tem maiores motivos para temer as investigações, a resposta será inequívoca: os apoiadores do ex-presidente. E por que eles defendem a CPMI? A resposta é simples: o que é uma mancha na roupa para quem já está afundado na lama? Pensando assim, tudo o que for imputado ao adversário é lucro.
Da parte governista, o risco, até agora, é serem escancaradas possíveis omissões e incompetências. A CPMI, por isso, surge como oportunidade para a oposição para sair das cordas e alimentar a pouco verossímil suspeita de que o quebra-quebra foi promovido a mando dos petistas. Essa tese ignora a informação de que todos os vândalos presos até agora, bem como os seus financiadores, têm DNA bolsonarista. Tem ainda a incômoda situação do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, que está preso e foi encontrada com ele uma minuta golpista, voltada para impedir a posse do presidente Lula.
Tem ainda os suspeitos de tentar explodir um caminhão-tanque carregado de combustíveis no fim do ano passado, o quebra-quebra no 12 de dezembro, dia da diplomação… E o mais grave: todos agiram diante da omissão das forças Forças Armadas, da Polícia Militar do Distrito Federal e de Gabinete de Segurança Institucional (GSI), este último extremamente aparelhado durante a gestão do general Augusto Heleno.
O que restou aos governistas, agora, foi bancar uma articulação forte para tentar tomar o controle da CPMI. Ou, pelo menos, evitar que um bolsonarista ocupe a relatoria ou a presidência da comissão. Eles confrontarão um grupo que já demonstrou força na hora de tumultuar o debate em audiências recentes em que tiveram à frente o ministro da Justiça, Flávio Dino. Apesar de terem sido amassados discursivamente pelo ex-juiz federal e governador do Maranhão.
O movimento recente de tentativa de apropriação da CPMI, por parte da ala governista, está sendo capitaneado pelo deputado federal paraibano Lindbergh Farias (PT-RJ). Ele fala em buscar o comando da relatoria e da presidência do colegiado, o que não será uma tarefa fácil e nem barata. O PL do ex-presidente tem o maior número de deputados e terá presença garantida na comissão. Mesmo assim, o governo tem condições de botar mais bala na agulha, caso a articulação seja bem-feita. Um vacilo neste momento pode trazer desgastes como o vivido por Bolsonaro no governo passado, com a CPI da Pandemia.
Inspirado naquele momento, Lindberg fala em trazer para o ringue os senadores Renan Calheiros (MDB-AL), Omar Aziz (PSD-AM) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP), estrelas da antiga CPI. Quer trazer da Câmara André Janones (Avante-MG). Eles terão a missão de tentar anular a onfensiva desenhada por estrelas da oposição como o senador Magno Malta (PL-ES) e o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG). O primeiro, analógico, é sabedor dos caminhos para fazer muito barulho. O segundo, digital e afeito às novas ferramentas de reverberação de informação, tem potencial de provocar estardalhaço.
Em hipótese alguma haverá, por parte da base governista, como conter danos. Basta lembrar que uma CPMI tem capacidade de travar votações no Congresso, justamente quando o governo precisa votar o arcabouço fiscal e a reforma tributária. Além disso, tentará levar Lula para o centro de um debate que só interessa à oposição. Os governistas trabalham com a tese de que estão tentando criminalizar a vítima. Isso, pelo que temos de evidência até agora, está ancorado nos fatos. O problema é que CPMI a gente só sabe como começa…
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